O Fim da Escrita
A notícia de que mais de 40 estados norte-americanos suspenderam o ensino da letra cursiva chegou ao Brasil como uma bomba e continua causando polêmica. Todos querem dar a sua opinião e até a Ana Maria Braga resolveu abordar o assunto no programa Mais Você exibido hoje (9/08) pela Rede Globo. De acordo com a reportagem publicada no site da Revista Crescer em julho “ a tradicional forma de escrever com a letra cursiva (de mão) foi considerada ultrapassada e o ensino deve ser abandonado em mais de 40 estados norte-americanos. “ Bom, toda polêmica para mim é válida. Principalmente quando serve de porta de entrada para discussões e esclarecimentos a respeito da educação brasileira.
Em primeiro lugar vamos esclarecer que o novo código adotado pelo estado de Indiana não propõe, em momento algum, que a escrita seja banida das salas de aula. Ao contrário, estabelece que o ensino da letra cursiva (Cursive Handwriting) não será mais obrigatório. Os que são contra a substituição da letra cursiva alegam que com a “letra de mão”, a criança desenvolve traços da sua identidade e personalidade além de desenvolver a coordenação motora fina, que poderia ser prejudicada pelo abandono da letra de mão. No Canadá, assim como em outros países considerados referência em educação, a letra cursiva só começa a ser ensinada na escola por volta do 3º ano do ensino fundamental entre outras razões para que as crianças possam ter acesso as mais diversas fontes de material impresso e possam lê-las sem dificuldades.
Os defensores do novo código argumentam que, atualmente, as crianças não necessitam e quase não se utilizam de caneta e papel para escrever e por isso a alfabetização deve se focar no ensino da letra bastão e nos métodos de digitação. Além disso, segundo Saad Ellovitch, neuropediatra do Hospital Samaritano de São Paulo, “O cérebro se adapta às necessidades do corpo. Você pode desenvolver a motricidade fina, ou seja, a capacidade de execução de movimentos pequenos e delicados, com outras atividades, como por exemplo, o desenho”, afirma a especialista.
Há algum tempo venho questionando a supervalorização que as escolas brasileiras dão para este tipo de letra. A tão falada letra cursiva é só mais um tipo de letra. Para aprendê-la basta treinar, treinar e treinar! O que está em discussão não é a aprendizagem ou o fim da escrita como se alardeia por aí mas sim, a Função Social da letra cursiva. E basta um olhar um pouquinho mais atento para perceber que não temos livros em letra cursiva, nem jornais, nem revistas, nem legendas de filmes, nem placas de sinalização e nem digitamos em letra cursiva no computador! A escrita tem uma função social que traz consigo a idéia de representação. Damos tanta importância ao fato de nossos alunos “escreverem de mãozinha dada” que produzimos apenas indivíduos alfabetizados, sujeitos que sabem apenas ler e escrever, quando deveríamos estar produzindo gerações de indivíduos letrados. O indivíduo letrado, não só sabe ler e escrever, mas também é capaz de utilizar socialmente a leitura e a escrita. Como afirma Artur Gomes de Morais “A condição de sujeito letrado se constrói nas experiências culturais com práticas de leitura e escrita que os indivíduos têm oportunidade de viver, mesmo antes de começar sua educação formal” (Morais e Albuquerque, 2004). Para quê então tornar obrigatório o ensino de um tipo de letra que a cada dia vem perdendo a sua função social? E levante a mão quem só utiliza a letra cursiva!